Monique Gardenberg é uma diretora bastante singular dentro do cenário cinematográfico nacional. Ela começou junto com a chamada retomada, em 1995, com o internacional JENIPAPO (que trazia como protagonistas o belga Patrick Bauchau, de O QUARTO DO PÂNICO, e o canadense Henry Czerny, de MISSÃO: IMPOSSÍVEL). Após o resultado bastante irregular da estréia, se aventurou, oito ano depois, em 2003, em adaptar o badalado romance de Chico Buarque, BENJAMIM, revelando ao mundo o talento da filha do ex-casal Glória Pires e Fábio Jr., Cléo Pires. Se o primeiro filme era uma intrincada trama de suspense e intriga, o seguinte apostava mais no instinto e na sensibilidade dos personagens principais. Ninguém arriscaria dizer, então, que ela seria a pessoa certa para traçar um painel popularesco de Salvador em Ó PAÍ, Ó, versão para a tela grande da peça musical homônima levada aos palcos em 1992 pelo Bando de Teatro Olodum. Mas não é que ela dá conta do recado?
Ó PAÍ, Ó é uma gíria baiana que significa "olhe para aí, olhe!", e que é usada na conversação mais ou menos como os gaúchos empregam o "bah". Ou seja, a qualquer momento e por qualquer motivo. O filme assumidamente não tem um roteiro único e fixo, uma trama fechada. Ao invés disso, procura imaginar um cenário representativo da cultura baiana. Roque (Lázaro Ramos, muito à vontade) é um jovem trabalhador preocupado em conquistar uma nova namorada e com o desfile do bloco do Araketu durante o Carnaval. Seu Jerônimo (Stênio Garcia, com uma dentadura incompreensível, numa pequena participação) é o comerciante que quer incentivar o fluxo de turistas em sua loja de antiguidades. Boca (Wagner Moura, exagerado, fora do tom) é um pretenso playboy racista e preconceituoso. A função dele é mais representar um segmento da sociedade dedicado a explorar o lado mais fraco, sem respeito por este. Dona Joana (Luciana Souza, a melhor do elenco e grande revelação) é a beata dona do cortiço que hospeda a maior parte dos personagens, como a mãe-de-santo, o travesti, o taxista e a mulher especializada em abortos. Passa o dia rezando, mas não pensa duas vezes em cortar a água quando os inquilinos atrasam o pagamento. Sua missão é criar os dois filhos pequenos enquanto espera pela volta do marido, que há anos a abandonou. Há ainda Psilene (Dira Paes, sempre competente), que esconde o verdadeiro motivo que a fez abandonar o namorado europeu. Como se pode ver por estas rápidas definições, são todos quase estereótipos, porém apresentados dentro de um contexto definido e com funções específicas, livrando-os de uma superficialidade desajeitada e indesejada.
Montado de forma ágil e inteligente por Giba Assis Brasil (O HOMEM QUE COPIAVA) e produzido com esmero por Sara Silveira (CINEMA, ASPIRINAS E URUBUS), ambos gaúchos, Ó PAÍ, Ó é um belo exemplo da produção nacional, ligado com as tendências que ilustram nossa cinematografia. É um longa alto astral, que só desvia desse caminho no final trágico e anti-climático, que, se necessário para o discurso, parece desafinar do tom empregado até aquele momento. Muito colorido, com boas seqüências musicais e envolvente. é um filme que alegra o espírito, sem deixar de provocar reflexão e análise. Monique cumpre bem a missão de fazer do seu um cinema verde-e-amarelo, conectado com o que aqui se faz e prolifera. Pode, após tanto impacto, parecer meio vazio, mas o mérito está justamente aí: unir conteúdo a algo esfuziante e belo.
Ó Paí, Ó, Brasil, 2007
(nota 8)
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