quarta-feira, janeiro 02, 2008

O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA

Mike Newell, diretor de O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA, afirmou, numa das entrevistas de lançamento do filme, que estaria com mais medo da reação dos fãs do romance de Gabriel García Márquez do que dos adoradores de Harry Potter. Pois esse receio tem fundamento, uma vez que a versão cinematográfica de O AMOR... é infinitamente inferior ao longa anterior dele, HARRY POTTER E O CÁLICE DE FOGO (quarta aventura do menino bruxo criado por J.K.Rowling). Não só a direção é canhestra neste novo trabalho, como toda a composição envolvida nesta adaptação tem percalços, a despeito dos inúmeros talentos envolvidos no processo.

A história é bastante conhecida: rapaz pobre se apaixona por menina rica e decide esperar por ela o quanto for preciso. O pai dela, ao saber do romance, a manda para o interior, para a casa de familiares. Anos depois, quando volta, afirma não sentir mais nada por ele, e acaba casando com um médico famoso. Ele não se conforma com a recusa, e em cada mulher que se envolve procura um pouco dela. Mais de 50 anos depois, quando ela fica viúva, ele reaparece, pedindo-a em casamento. Apesar da proposta ser recusada com veêmencia, aos poucos ela vai cedendo, até que o "amor eterno" dele finalmente se concretize.

O inglês Mike Newell sabe contar histórias de amor - vide o imenso sucesso de seu filme mais elogiado, QUATRO CASAMENTOS E UM FUNERAL. O problema aqui é a vontade de se intrometer num mundo que lhe é completamente estranho - e o fato do roteiro ter sido escrito pelo sul-africano Ronald Harwood (vencedor do Oscar por O PIANISTA) não colabora muito. O que para os latinos soa ardente e sexy, na visão européia pode se transformar em caricaturesco e irônico. E é o que muitas vezes acontece, desde pequenos detalhes até mesmo na composições de personagens fundamentais. E, assim como visto em filmes como A CASA DOS ESPÍRITOS, esse "olhar estrangeiro" não será competente o suficiente para captar todas as nuances propostas pela obra original.

O elenco internacional é um caso à parte. O espanhol Javier Bardem (MAR ABERTO) é uma escolha mais do que acertada como o protagonista Juvenal, e ele por si só já faz valer o ingresso. Cada gesto, cada manifestação de desejo, amor ou frustração ganha uma magnitude inesperada quando envolta pelo olhar deste ator fenomenal. Por outro lado, a italiana Giovanna Mezzogiorno não consegue ficar à altura dos bons trabalhos feito em seu país natal, como os memoráveis O ÚLTIMO BEIJO ou A JANELA DA FRENTE. Submissa, acaba sucumbindo tal qual sua Fermina, passando pela tela sem se fazer notar. A colombiana indicada ao Oscar Catalina Sandino Moreno (MARIA CHEIA DE GRAÇA) pouco faz com o tempo escasso que tem em cena, assim como os americanos Liev Schreiber (SOB O DOMÍNIO DO MAL) ou Benjamin Bratt (MISS SIMPATIA). Já o também colombiano John Leguizamo (MOULIN ROUGE) é um desastre: tudo bem que o pai da moça precisa deixar claro sua contrariedade quanto à atração da filha pelo pobre rapaz, mas seus exageros o fazem se assemelhar mais a um sanguinário assassino do que a um homem de posses tentando defender sua honra. Por fim, felizmente, uma boa notícia: a estréia da nossa Fernanda Montenegro num projeto hollywoodiano está acima de qualquer deslize da produção. Mesmo num papel secundário, ela injeta uma vitalidade singular e fundamental na história. Os momentos de preocupação com o filho devoto a um amor improvável até a loucura final se alternam com suavidade e total controle, mostrando que não é o tamanho do personagem que faz diferença quando há experiência e sabedoria em jogo.

Fernandona, aliás, não é a única brasileira na equipe de O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA: o diretor de fotografia, responsável por cenas belíssimas, é Affonso Beato (que já trabalhou com Cacá Diegues e Pedro Almodóvar), enquanto que a trilha sonora ficou à cargo de Antonio Pinto (de CIDADE DE DEUS, COLATERAL e O SENHOR DA GUERRA, entre tantos outros). O trabalho deste, em conjunto com a pop star Shakira, aliás, responde pela única indicação do filme ao Globo de Ouro: Melhor Canção, para "Despedida". Um reconhecimento justo, porém muito aquém da expectativa levantada quando sua realização teve início. Estivesse passado pelas mãos de cineastas mais familiarizados com este universo, como Walter Salles ou Alfonso Cuarón, certamente o resultado teria sido muito diferente. E o fato de ser todo falado em inglês não colabora em absolutamente em nada: nem no faturamento internacional, uma vez que arrecadou menos de US$ 5 milhões nos Estados Unidos, apesar de ter custado quase 10 vezes este valor! Por fim é mais um produto multicolorido feito para turista se entreter por alguns trocados e por poucos minutos - e, dessa forma, esquecer logo em seguida, assim como todos os envolvidos em ambos os lados da tela!

Love in the Time of Cholera, EUA, 2007
(nota 6)





Um comentário:

Anônimo disse...

Vi ele domingo passado e assumo que me assustei com o inglês forçado a espanhol dos atores, hollywood fode as coisas em nível cinco mil, o filme é bem difícil por ser longo, tá aí vc diz, mas tem filmes que são tão ou mais longo e a gente nem percebe, mas eu afirmo, amor nos tempos do coléra só ficou chato por que é inglês, tipo, señor, over here... é ridículo isso, mas hollywood, por que os terroristas não explodem aquele lugar hein?